Diagnósticos:
As cidades são inseguras por não serem inclusivas. Os atuais modelos de segurança pública mais difundidos são baseados em vigilância, policiamento ostensivo, repressão e segregação social no espaço público. O terror, o medo e a violência são propagados de forma distorcida nos meios de comunicação, alimentando preconceitos sociais e culturais. A ideia de violência é usada para vender serviços e produtos de segurança privado. O conceito de segurança usado no senso comum aponta apenas para os artefatos de controle e monitoramento, como câmeras de vigilância e catracas de acesso controlado.
A sensação e a condição efetiva de insegurança nos espaços públicos resulta também da separação excessiva em relação aos espaços privados, além da precariedade de iluminação pública e da abundância de espaços vazios ou subutilizados existente no contexto de muitas cidades. No âmbito privado, vende-se sistemas de segurança que buscam afastar as pessoas do espaço público, adotando a lógica da vida em condomínios privados de acesso restrito, com uso intensivo de transporte individual em detrimento ao coletivo, e a contratação de serviços particulares de segurança.
A priorização excessiva do carro no desenho e construção das vias urbanas tem favorecido o uso de altas velocidades (de pico) pelos veículos privados, que podem até causar uma sensação de mobilidade eficiente, mas resultam em riscos graves para todos. As vias tem sido projetadas quase exclusivamente para veículos motorizados, sem considerar a demanda crescente para uso de modais não motorizados ou mesmo a circulação e permanência de pedestres no espaço público. Faz-se necessário compartilhar e conciliar os diversos modais de transporte no espaço público no sentido de pacificar a relação entre os diferentes sistemas de mobilidade.
A violência urbana praticada no Brasil tem origens na cultura escravocrata (racista) que foi incorporada à vida nas cidades. Neste contexto, manifestações populares são tratadas de forma truculenta e violenta pelos agentes do Estado. A polícia brasileira tem índices de letalidade altíssimos, cometendo mais de 55 mil homicídios por ano, sendo que a diferença de mortes entre brancos e negros (taxa de iniquidade) chega até 1700%, o que demonstra claramente a cultura racista que está institucionalizada (Fonte: www.http://www.mapadaviolencia.org.br/pdf2015/mapaViolencia2015.pdfr).
Carência de ações policiais protetivas em relação à violência de gênero. Diversas formas de violência com grupos sociais, motivadas por preconceitos e discriminações, não são identificadas, nem consideradas como abusivas. Este comportamento, baseado na abordagem intimidadora, é comum por parte da polícia em relação a determinados grupos sociais. Além disto, o policiamento não está distribuído de maneira uniforme pelo território urbano, além de atuar de modo muito diferente em função do perfil sócioeconômico de cada localidade. Também é muito grave o baixo nível de registro oficial (subnotificações) de muitos tipos de crimes, por diversos motivos, entre eles: medo da polícia, descrença no sistema de segurança pública, omissão por parte de profissionais de segurança e da área de saúde.
Recomendações:
Debater amplamente e revisar o papel da mídia na construção da percepção do medo, do racismo e da discriminação relacionados com a segurança pública. Esta revisão deve resultar em marcos regulatórios sobre o poder de distribuição e produção de conteúdo midiático.
Fomentar a cultura de paz (por meio de diferentes equipamentos – sociais, culturais, esportivos – políticas, canais de mídia, ensino escolar, etc), no sentido de promover o diálogo e o respeito entre diferentes segmentos sociais e culturais.
Revisar o papel dos parâmetros urbanísticos como indutores para redução de barreiras entre os espaços públicos e privados, favorecer a permeabilidade entre a rua e as edificações. Reduzir a velocidade máxima nas vias de automóveis para minimizar acidentes, para melhorar o fluxo coletivo e pacificar a relação entre veículos e pedestres.
Desenvolver uma cultura de conciliação e respeito aos diferentes tipos de transporte. Uma possibilidade é através da implantação de projetos de vias urbanas que não sejam baseados na separação absoluta entre os modos de transportes – carros, bicicletas, pedestres e ônibus. Este tipo de solução estimula a cultura de deslocamentos individuais em altas velocidades, que por sua vez favorecem acidentes e violência no trânsito.
Melhorar a acessibilidade dos espaços públicos, estimulando a recuperação de pavimentos e a eliminação de barreiras arquitetônicas por meio de incentivos fiscais para os imóveis. Estimular o uso e a ocupação dos espaços públicos com eventos para resgatar as oportunidades de encontro e as culturas locais.
Informar e sensibilizar a sociedade em relação ao homicídios cometidos pelo Estado, para promover a desmilitarização do policiamento voltado aos civis. Reestruturar os processos de formação e treinamento dos policiais, com inclusão de normas para tratamento digno de manifestações populares.
Revisar os métodos e procedimentos utilizados para notificar diferentes tipos de crimes, como homicídios e suicídios, evitando a subnotificação e a distorção das estatísticas a respeito da violência.